quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Justiça seja feita


Sabe quando passamos a gostar de determinado disco somente após escutá-lo pela quinta vez? Pois bem. Foi assim que aconteceu comigo e o quarto trabalho de estúdio do Otto; só que na sexta vez. ‘Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos’ é, de fato, um belo álbum. Antes, uma breve errata.

Há pouco mais de um mês, quando do primeiro post de 2010 aqui nesse mesmo blog, eu – e meu alter-ego momentâneo Rob Fleming – listei os sete melhores álbuns lançados no ano passado. Inconformado pela ausência de obras nacionais no top, Leonardo Rocha (também autor do 1queFaltava), depois de dizer um monte de bobagens e ser questionado sobre qual disco “brazuca” deveria figurar na lista, citou o dito cujo. Naquele momento, cheguei a dizer que, apesar de gostar do artista, ele ainda precisava comer mais um pouco de feijão. Ledo engano. Nunca é tarde para se retratar.

Até então, tinha escutado o disco apenas uma vez. Lembro que o baixei pela internet quando de seu lançamento em New York, em setembro, e o deixei encostado no meu HD durante um bom tempo. Quando o mesmo começou a fazer barulho por aqui, em dezembro último, me lembrei de ouvi-lo. Feito isso, não gostei. Talvez porque tenha soado um pouco estranho; talvez porque tenha parecido não-Otto.

Acontece que o Otto mudou, o próprio título nos dá uma noção: uma transcrição da primeira frase de ‘A Metamorfose’, romance de Franz Kafka, em que a personagem acorda transformado em barata: “Certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranqüilos”. Tudo que me fazia acha-lo estagnado, repetitivo e sem tempero foi deixado de lado, quase que abandonado. E boas inovações ganharam espaço. Eis aqui, os motivos de ‘Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos’ ser algo merecedor de destaque.

O título e a lembrança à obra de Kafka parecem dizer respeito a uma serie de mudanças na vida e na carreira do artista. Divorciou-se de Alessandra Negrini e perdeu a mãe e a afilhada. Além disso, ficou sem gravadora. Mesmo assim, com esforço e recursos próprios - e a ajuda de parceiros - lançou seu melhor álbum. Na fabricação da obra, largou mão daquela obsessão pela exploração do beat, presente em seus trabalhos anteriores (um tremendo avanço em minha opinião, tendo em vista que esse movimento já deu o que tinha pra dar) - apesar de a tendência percussiva manter-se presente - e deu lugar a arranjos eletrônicos, guitarras ríspidas, metais, mais cordas e vocais diferentes: ora acidentado, ora melodioso, ora seco. Aliado a tudo isso, estão as participações de convidados no disco. As cantoras Céu e a mexicana Julieta Venegas, os músicos Catatau (guitarrista do Cidadão Instigado), Pupillo e Dengue (baterista e baixista da Nação Zumbi) e Lirinha (Cordel do Fogo Encantado) deram suas contribuições em forma de toques especiais. A produção ficou por conta do próprio Otto em parceria com Pupillo. O artista Tunga assinou a capa, muito bem feita por sinal.

Portanto, venho aqui através desta humilde declaração, dizer que ‘Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos’, lançado ano passado de forma independente pelo artista Otto, merece alçar vôo até o posto 7 daquela lista feita no início de janeiro. Ganha de goleada do que listei nessa mesma posição anteriormente: o Ep ‘Fall Be kind’, dos chatos do Animal Collective, que, por sinal, só estava lá por conta de algumas observações. Apesar de pertinentes, Otto fez delas meras passagens textuais.

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