segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Papo ruim


Há tempos que criticar a política e seus ‘desenrolares’ virou clichê. Todo e qualquer espaço como este, espalhado pela imensa ‘blogosfera’ brasileira já tratou disso, com ou sem embasamento, destreza e autoridade. Dizer que o que acontece dentro do Senado, da Câmara e do Planalto é uma vergonha já é mais comum do que proferir um simples “graças a deus”. Balela, lero-lero, papo furado. De nada adianta. Nada se resolve. Nada muda.

Mas os acontecimentos dos últimos dias me deixaram, além de muito envergonhado – lógico, estupefatamente boquiaberto. Não pelo ocorrido em si, absurdo nenhum é novidade naquele pardieiro; mas sim pelo o que se pôde ouvir e captar de declarações de personagens envolvidos.

Quando do arquivamento das 11 denúncias contra José Sarney pelo Comitê de Ética do Senado, fui obrigado a ouvir o Delcídio Amaral (PT), quando perguntado sobre o resultado, dizer que a bancada acatou as orientações do partido, enviadas por carta do presidente Ricardo Berzoini a todos os parlamentares da legenda. E a orientação própria, não existe mais? Não. Não tem valor. Diferente mostrou-se Flávio Arns (PR), que, ao que de longe parece, ainda tem um mínimo de postura, visto que já enviou seu pedido de desafiliação ao PT. Digno, mas agora irão caçá-lo por infidelidade partidária.

Nesse mesmo episódio, desastroso, diga-se de passagem, o incrível Aloísio Mercadante, líder, disse (não sei se pela boca) que sua decisão de abandonar aquela pocilga era irrevogável. Sua palavra caiu após uma conversa com o presidente, o mesmo elemento que, no momento em que o coronel balançava feito vara de bambu, matou a ‘bola’ no peito e a dominou. Sempre foram muito amigos, não? Agora o cara ta lá mais firme do que nunca, mandando e desmandando, com a astúcia (sic) de sempre, naquele bando de boi.

No fim da semana anterior, o deputado de São Paulo, Antônio Palloci (PT), foi absolvido das denúncias de quebra do sigilo bancário do tal caseiro e pode novamente candidatar-se, por exemplo, ao cargo de governador de SP. O ministro do STF Marco Aurélio Mello, a favor da continuação da investigação – é bom frisar, disse que, apesar do resultado negativo (e apertado), cada ministro do Supremo “votou com a sua consciência”. É... agora a consciência encontra-se no orifício anal.

E em meio a essas audiências poderosas e falas de merda dignas de total desprezo - em um ambiente onde cobra criada canta de galo - a boa Marina Silva bateu em retirada do PT e afiliou-se ao Partido Verde (PV), muito provavelmente para concorrer à presidência nas próximas eleições (vejo com bons olhos, desde que Heloísa Helena não seja vice). E, numa reunião ‘especial’ feita na madrugada de quarta para quinta-feira passada, aprovou-se a criação de mais oito mil cargos de deputados. Agora a turma para reivindicar salários maiores cresceu significativamente.

Sem comando, sem vergonha, sem decência e sem o mínimo que se exige de uma nação. E vale lembrar que nós, o povo prejudicado, somos direta e totalmente responsáveis por isso. É o Brasil, um país de todos.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

A fantástica e inóspita razão de Aturdido da Palavra


Toda conversa carrega em si um caráter de conversão. Foi assim que Aturdido da Palavra descobriu sua vocação para escutador. Cobrava, mirradamente, para ceder seus aceirados ouvidos a um qualquer. Como não discorria, apenas orelhava seus monolocutores, desenvolveu uma fantástica e peculiar característica ao decorrer dos anos. Aturdido costurava na cabeça as estórias que ouvia e, assim, as vivia em pensamento. Singularmente, deixava de viver as suas e vivia as dos outros em sua cachola.

Certa vez, já sabedor de suas especialidades, veio a seu encontro um senhor alvo, de olhos cerrados, barba de terceiro dia e palavrear não estranho. Era sua personalidade, carnificada, materializada, em pessoa pleonasticamente. Coeso de Nascimento (pseudônimo de Aturdido) vinha cobrar de seu descuidado as estórias que não mais vivia, mas apenas escutava. Silenciosamente atencioso, o rapaz meneava a cabeça ao concordar com sua figura dramática e apenas baixava os olhos quando do contrário.

De início, ainda sem entender bem o que acontecia, Aturdido fez jus a seu nome. Posteriormente, acreditava ser esquizofrenia. Finalmente, mais aceitou que descobriu que era mesmo sua personalidade num lampejo de esquecimento. Ela, curvada pelas estórias de outros, começava miudamente a desaparecer – posto que personalidade sem estória é como pássaro sem asas, pedra sem chão, árvore sem terra, no popular, pão sem manteiga. Coeso sempre orientava seu “cavalo” para tomar cuidado.

- Aturdido, Aturdido, dia desses você vira ex-Aturdido.

Passaram-se anos e nada de estoriar por aí. Era sempre aquele tecer pelo ouvido os dizeres dos outros. Rendava seus pensamentos com calor de jágora!. Construía uma única história com diversos retalhos de imagens-cuca. No entanto, iniciou-se um acontecimento inusitado. A cada lance de invenção, inaugurava-se um pequeno buraco em seu corpo que vazava para o outro lado, como se quem visse enxergasse uma pessoa vazada. De pronto, não deu muita importância. Quase não usava seu miúdo esquerdo do pé mesmo. Nem a ponta de seu nariz, que começava a se borrar feito esfumato pelo rosto. E o caso ainda havia de acumular-se. O cérebro enviava a informação para o músculo. Este, por sua vez, sendo interrompido no caminho, não a completava, causando em seu corpo um intenso não-se-saber-se de movimentos descompassados. Era como se a cada tentativa de estender a mão produzisse uma dança estranha, curiosa, que reverberava por todo seu corpo, causando uma impressão jocosa em quem o assistisse.

No entanto, apesar do fato, Aturdido não estancava sua inércia. Continuava a não cursar sua individualidade. Estendiam-se suas não-estórias. Já velho, foi penosamente vítima do olvido, malefício corriqueiro às rugas. Assim, suas rendas começaram a se esfarinhar pela cabeça, cada canto do oco se escurecia apagando uma a uma as candeias de sua imaginação. Todo romance guardado em seu côco era subvertido, reestruturado, finalizado e, por fim, esquecido. E a cada rodada destas, agravadamente, Aturdido ia, miopimente, embaçando-se em direção ao nada. Verdugo, o tempo calhou de tomar seus dias, consumindo-o como um buraco-negro, degenerando-o como uma estrela. Escafedendo-o por completo.

Anos correram, pessoas, novas casas se erguiam a cada ruína, velhos, cachorros, crianças com mania de super-homem, cadeiras de balanço, silêncios noturnos, brigas, incoerências, invenções, imaginações e, ao final, todos sabiam da história do homem que desapareceu, tornando esta, a fábula de Aturdido da Palavra.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Nota rápida


Eles podem até nos chamar de macacos e dizer que a capital daqui é a de lá. Ou ainda insistir que Maradona foi mais do que Pelé. Balelas à parte, além da Patagônia e da boa gente (sim, boa gente sim), eles possuem 'boas mãos' para cozinhar. Assim como a nossa, a culinária argentina é perfeita para os que procuram na comida local um atrativo a mais.

Falo isso porque hoje saiu mais uma crítica gastronômica escrita por este que vos arrota no Mondo BHZ (interessante guia crítico de artes, cultura e entretenimento de BH - como já pude lhes dizer outrora). E dessa vez, o foco caiu justamente por sobre a comida argentina que, há quem diga, é melhor que o futebol de lá. E feita aqui.

Apresento-lhes então, o Pizza Sur - gracioso restaurante argentino que é, sem dúvida nenhuma, uma bela pedida aqui em nossa tenra capital: clique.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Luas da cabeça


Vinha àquela sensação de angústia, aperto. Não sabia bem como se desviar, evitar o porvir. Talvez, bem diziam, surrupiava-o. Nos instantes do aqui, redundava-se no mesmo. Caminho de volta para casa, roça de ida para o nada. Esquivar-se de algo que tem certeza, o invólucro do medo. A esperança, melindrosa, hoje quase menina mimada, era de que tudo transformaria. Sempre. É no sempre, no irracional, que pensamos o ridículo que é. O puritano em busca da bruxaria. O pássaro em busca da tempestade. O peito no rascunho do coração. No mais, “vai nascer, ô trem!”.

O poeta medíocre se contenta com o mínimo
O não inteligível para as massas

Se recobre de ouro

Lambuza-se de Eus

O poeta medíocre é sempre o outro

O poeta medíocre sente cãibra no oco da cabeça

Cambiava o Eu na resistência ao Outro. No através, a fábula. Nunca resistiria aos olhos fatigados, ao menear do tronco, ao ímpeto da queda pelo simples risco de quedar-se. O nariz do Outro é fino, não empinado. Suas esticadas já no quase. A vista do outro vislumbra, aparentemente, o mesmo do Eu. Esmorecidos, ambos, gorjeiam suas palavras em tom mesmo. Assoviam os olhos do Eu. Cochicham os lábios do Outro. Resmungam os dois, em uníssono. Cabotino, o Outro era Ela com Eu na saudade do antes e no ímpeto do hoje.

A borda do peito. O risco do mundo. O balão. A angústia atrofiada, desgastada, concede, enfim, trato. De canto, ganhando a morte ainda em vida, o Eu respira rascante um ar que não é de alívio. Como se inflar a caixa estendesse a dor, cultivasse em seu peito um jardim em que brotam flores negras, exalam aromas fúnebres. Nele, rabiscam pelo céu cinzento pássaros com olhos rubros, que cantam um hino triste, desses que atravessam a gente. O rufar da grama crescendo aclarava para os ouvidos onde não havia imagem. Estranho como palavras podem prender mais que cordas.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

MPF veta MMX


Nesta quarta-feira (12), tomou-se ciência que o MPF (Ministério Público Federal) ajuizou ação civil pública para impedir a continuidade das obras de instalação do Mineroduto Minas-Rio – o empreendimento milionário e profundamente impactante, especialmente na região mineira da Serra do Espinhaço, da mineradora MMX, do sheik brasileiro Eike Batista.

Motivou a ação do MPF as irregularidades, que não são poucas, observadas no processo de licenciamento ambiental do empreendimento, localizado em uma área de extrema relevância ambiental, declarada Reserva da Biosfera pela Unesco.

A primeira delas: o empreendimento, e consequentemente, o licenciamento, foram fragmentados. Ou seja, a mina – que compreende os municípios de Conceição do Mato Dentro, Serro, Alvorada de Minas e Dom Joaquim – vem sendo licenciada pelo órgão ambiental mineiro, a FEAM (Fundação Estadual de Meio Ambiente), o mineroduto – por abranger mais de um estado da federação - foi licenciado pelo Ibama, e, o Porto de Açu, pelo órgão ambiental fluminense, o INEA (Instituto Estadual do Ambiente).

Ora! É óbvio que tais estruturas não existem de forma independente; uma só existe em função da outra. O MPF acertou, portanto, ao entender que o fracionamento ocorreu para driblar os entraves ambientais que certamente teriam de ser enfrentados num licenciamento único.

Há ainda a agravante de que as licenças do mineroduto foram concedidas sem a devida análise do EIA/RIMA (Estudo e Relatório de Impacto Ambiental), que fora produzido por equipe técnica sem a formação exigida, com indefinição do traçado final do duto e que não é claro o suficiente quanto à supressão de Mata Atlântica em estágio primário e secundário avançado de regeneração.

Segundo nota do MPF, em audiência pública realizada em Alvorada de Minas, o empreendedor afirmara ainda que não haveria qualquer interferência do mineroduto em patrimônio cultural e arqueológico. Contudo, após essa data, protocolizou relatório complementar ao EIA informando que o traçado "atingirá diretamente vários sítios históricos e arqueológicos", mas sem especificar o impacto exato nessas áreas e se haveria demolição das construções históricas.

A ação elenca ainda diversas falhas graves existentes no licenciamento da mina, desde a inobservância do zoneamento econômico ecológico de Minas Gerais até a formação inadequada da barragem de rejeitos.

Ao darmos conta de um licenciamento ambiental tão às coxas como o do Mineroduto Minas-Rio, vemos à tona e refletimos mais uma vez sobre a velha discussão, por vezes já banalizada: Desenvolvimento X proteção do ambiente. Mas há que se crer que não há dualismo neste processo. O que está em jogo, além, é óbvio, do lucro do empreendedor, é a qualidade de vida das pessoas – seja com ou sem empreendimento.

Portanto, o mínimo que se espera é um licenciamento coerente, minucioso, desburocratizado e que, de fato, seja capaz e tenha peito de dizer se um empreendimento é ou não viável do ponto de vista social, econômico e ambiental.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Crônica de um amor bobo (ou romance medieval)


Gracejais-vos, linda menina. Não entendeis como são simples os vôos pássaros. E ainda argumentais que tudo isso não passa de bobagens, desculpas de fim de semana. Mas não percebeis nossas vontades, costumes. Não eram apenas nossos sonhos que vos deixais ao abandonar-me. Eram também os anos de vossa vida que passastes ao lado de quem não quer. Doía-me, rasgava-me, percorria em meus braços rios de sangue seco. Hoje, recuperada, borda vossos beijos com outro. Preocupais, pois eu me preocupo. Isso de tentar ser exatamente aquilo que se quer, não pode desembocar num simples vai-e-vem de lembranças, um sem tanto de vontades perdidas. Por isso, vossos olhares são outros, perderam-se naquele primeiro papo, de onde entregastes todos os vossos segredos, mentiras e arrependimentos. Mas do lado de cá, fica um adeus que me contastes.

Tu então, ao veste de longe que caminhaste de forma torta, retrato de tantas falhas, cruzaste o meu caminho mais uma vez. Desta investida, usaste de todos os partidos e melenas de vozes que guardaste como cartas-curinga no arcabouço de teu cabedal. Desajeitada, tropeçaste em vários contos que, embora convincentes, já ouvira em tempos supracitados. Não era de se estranhar, ao vê-la gaguejar em meu ombro, sofrida de toda dor, que os melhores anos de tua vida, passados comigo, haviam se tornado tuas mais doces recordações. Abandonada, vilipendiada, talvez consigas acreditar que em tal amor ainda a tenho, por isso me procuras, mesmo depois de descobrir que tuas madeixas, bordas e olhares haviam feito o mesmo comigo. Mas não implores mais, é inútil, hoje estou limpo de ti.

Você que tantas vezes me roçou seus prazeres, olhares, bocas e pernas, hoje me faz acreditar no desamor. Nunca deveria ter me causado tanto desencanto, pois, agora, não me lembro mais do mínimo que um dia lhe quis. Apesar de tanto rio fresco, tanta flor de olhos, tantos lumes que apagou com sua presença, não lhe quero mais. A bondade que guardava em meu peito na espera de sua volta se foi, tornou-se balão branco pelo céu clareza. Os olhos marejados pelo acaso, provocado por um simples caso raso, não gotejam mais essa nostalgia de tempos dantes. Com a ingenuidade de uma semente, que não sabe que vai crescer, posso creditá-la no passado. E agora, estável como a Lua, fim do túnel do céu, lhe digo: tu e vós nunca mais me permitiram acreditar em você.

domingo, 9 de agosto de 2009

O engodo do Senhor


Nome: Cleycianne. Slogan: "uma serva do Senhor no mundo da internet". Foto: Photoshop. Pró: oportunismo e originalidade. Contra: uma mentira bem/mal contada. Se existe algum lugar, mesmo que abstrato, no mundo em que é possível anarquia, este lugar é na internet. É aqui, neste espaço imensurável de informação, que atualmente músicos, poetas, cronistas, críticos, e toda pá de "comunicólogos" se manifestam, são conhecidos, seguidos e, por fim, vendidos a alguma empresa e/ou ideário, posto que pros dois.

A antes infortunosa vontade de se criar uma página na web, com tantos códigos binários, htmls confusos e afins, hoje cedem espaço aos geniais blogs - digo com conhecimento de caso, não entendo patavina de edificação pagística na net. Em vista disto, milhares são os modos de se fazer ver (Orkut, Myspace, Blogspot, Twitter, para citar os farofas) e tornar algo doméstico em multinacional. Relato então.

Fui apresentado por minha namorada a um blog que, de tão estapafúrdio e original, provocou-me a escrever sobre. A figura (no sentido figurado da palavra mesmo) é de uma suposta jovem que execra tudo e todos que, ao seu ver, embatem sobre a figura de Deus, todo poderoso, onisciente, onipotente, onipresente, criador do céu, do mar, da terra, do Google, da anestesia, da larica, da luxúria, do cobertor em dias de frio, do ar condicionado nos de calor e, por fim, da Internet - última e, talvez, sua maior invenção nos dias de hoje.

Falar sobre religião, futebol, mulheres (vide Maria Madalena, trabalhadora, honesta e hoje santa), sempre causaram querelas infindas. Se todo religioso fervoroso bebesse um pouco mais, seríamos uma nação muito menos preconceituosa, reacionária e finalmente feliz, variando sob a quantidade de álccol ingerido. E viva o triglicérides, a cevada e a anfetamina!

Para tanto, provocar um micromaremoto nas ondas webísticas parece ser algo mais astuto que audacioso, mais de abordagem que de conteúdo, mais cão que ladra mas não morde. Cleycianne é menina de família (como todos somos), decidida e íntegra (como todos mentimos ser) e integrante de uma furiosa verdade: começa muito bem a entender os nichos internéticos.

Para afiar ainda mais o corte na carne e constar nos orifícios alheios, reparem que no blog da
moça existe um link, do futuro, para outro blog, solta o frango, que, desapercebidamente, direciona o usuário da página de Cleycianne para outro que é proporcionalmente antagônico ao da moça. Calma, acessem e entenderão.

Tendo um blog em rosa, várias fotos "sugestivas" nas postagens e 181
seguidores até o presente texto, não é de se estranhar que um pinto seja sua imagem no Twitter.

E aleluia ao placebo epifânico!

ATESTEM VOCÊS MESMOS:
http://cleycianne.blogspot.com

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A intolerância de Hélio


Goiás e Flamengo se enfrentaram na última quarta-feira, em partida válida pelo Campeonato Brasileiro. Não quero aqui desmerecer o grande jogo disputado, de cinco gols, que levou a equipe esmeraldina à vice liderança da competição e distanciou o Rubro Negro do G-4, mas minhas atenções se concentraram às declarações do treinador da equipe goiana, Hélio dos Anjos, antes mesmo da bola rolar: "Tenho ódio desses flamenguistas do interior de Goiás. Eles são uma vergonha, não tem identidade nem caráter para honrar a própria terra. Pelo contrário, vestem a camisa do Flamengo, ou de qualquer outra grande equipe de fora, e vão ao estádio torcer contra um time do seu estado. Na próxima quarta-feira vai ter um monte de flamenguista chato invadindo o campo, querendo tirar foto (com os jogadores do Flamengo). Eles que fiquem em casa, pois serão todos inimigos para mim", disse.

Antes mesmo de registrar minha opinião sobre a xenofobia de Hélio dos Anjos, cabe esclarecer que sou flamenguista e mineiro – muito provavelmente, a identificação com a situação tenha sido a principal motivação para a escolha da temática deste artigo. Porém, a intenção não é fazer aqui uma defesa do torcedor de um time que não é do seu estado natal - mesmo porque as declarações, de tão esdrúxulas e sem nenhum fundamento, por si só não merecem defesa. Parafraseando um nobre deputado brasileiro, tenho certeza que os goianos rubro negros, assim como eu, “estão se lixando” para a ira do treinador. Este artigo é, sim, um manifesto a favor da liberdade, da livre escolha, seja ela para se eleger um político, adorar um messias ou mesmo torcer para um time.

Não me sinto menos mineiro por torcer para o Flamengo. Da mesma forma como não me sinto menos brasileiro ao preferir o rock, especialmente britânico, a qualquer outro estilo musical. As preferências e identificações nem sempre vão de encontro ao que se está próximo e isso é uma condição humana. A tolerância deve sempre permear as relações, especialmente quando se trata de uma figura pública, que fala para milhões quando o microfone está ligado.

A dica que fica


Como já devem saber, tenho por hobby a escrita. E disto me fiz valer para mais uma nova empreitada: o Mondo BHZ. Trata-se de um site de crítica cultural, cujo foco aponta certeiramente para o circuito artístico de Belo Horizonte; uma espécie de guia, bem legal. A iniciativa é do jornalista Salomão Terra, que também é editor da Revista Opperaa, outro veículo interessante de destaque na rede.

O objetivo é ser a agulha magnética da bússola descompassada que é a cena cultural da capital mineira. Sugerir e advertir sobre lugares para ouvir música boa, conversar sobre coisas relevantes, comprar bons livros, ver bons shows e, principalmente – no meu caso –, comer bem. E beber também. Resumindo, dar nosso ‘pitaco’ sobre o que aquece e ‘des-aquece’ o cenário cultural de BH.

A minha humilde colaboração diz respeito à gastronomia, outro hobby assumido por este que vos escreve. Como glutão e amante da boa mesa que sou, além de boêmio confesso, passearei cidade afora cornetando todos os lugares que resolver tomar sento. Meu intuito será percorrer por sobre a baixa gastronomia, que nem de longe significa coisa ruim ou pior. Não mesmo! Acontece que o requinte (na maioria dos casos) traz consigo o alto preço, o que, creio eu, não interessa a maioria de nós. Mas isso não quer dizer que deixarei de ir a lugares mais sofisticados. Definitivamente não. Até porque, como já dito, sou amante da arte de comer bem.

Portanto, acompanhem o Mondo BHZ que, além da minha simples participação, tem várias outras coisas bacanas e que merecem ser lidas. Nossa cidade, ao contrário do que pode parecer, respira ares de boa cultura; em todas as suas vertentes. Apesar, obviamente, das porcarias que por aí estão e que por nós não serão recomendadas.

De estréia, analiso o Bar do Mulão, um admirável boteco do bairro Caiçara que merece ser conhecido e freqüentado. Espero que gostem e façam bom usufruto do que escrevemos lá. Agradeço ao Salomão pela oportunidade de dar mais vida ao meu hobby e, de antemão, aqueles que por ventura passarem a apreciar nosso trabalho. Vocês também podem seguir o Mondo BHZ pelo Twitter. Ou eu, e o Salomão também.

Fica a dica!

domingo, 2 de agosto de 2009

Relatos de um carrapato


Estava eu, carrapato, no aguardo de algo que lambesse a fina agulha da ponta do capim. Como de sempre, buscava apenas sorver sangue em qualquer hospedeiro que me fosse gentil - ou não. Em estado de alerta, balançava por sobre uma trilha, ante minhas proporções despenhadeiro, alternando essa atenção com o vislumbre da vista que alcançava. De súbito, senti algo roçar em minhas micro-patas e, num levante de milhonésimo de segundo, agarrei pêlos como se fossem asas. Estabelecido e em silêncio absoluto, aguardava o momento certo de começar minha função de existência (talvez a única que me orgulho, posto que transmitir doenças é um ofício que não me agrada, mas que sou sucumbido a aceitar por motivos divinos que desconheço). Assentado em um lugar cômodo, sensível e de complicada localização, hasteei meus ferrões e sapequei-os na superfície.

Calmo, sereno e em saliva, comecei meu constante sugar sem me preocupar com o que, dali para frente, poderia acontecer. Suga, suga, suga, suga, suga, suga, e clack! Sou arrancado de meu hospedeiro de forma bruta, sem pedidos ou observações, e começo a travar uma luta no corre-esquiva de unhas humanas. Tento escorregar pelos dedos, sou apanhado, fujo em disparada, sou novamente apanhado e, em fim de vida, sou esmagado com força inimaginável, não tendo compreendido ou ao menos sendo orientado sobre o motivo do acontecido. E agora, entendendo a razão do nome "carrapato estrela", deixo uma inadagação mediúnica, posto que estou morto: para que existi, existirei ou existo, se naquilo que sou melhor em fazer sou vilipendiado e lançado ao mais desconhecido dos destinos? Oras, carrapato existe para picar e sugar sangue. Queria saber se o dentista, em seus movimentos sádicos, também não receberá, futuramente, meu desafortunado fim.