quarta-feira, 31 de março de 2010

Da passagem (ou sobre mais leros-leros)

Eis que chega o feriado da Semana Santa, que de santa, para mim, não tem nada. Muitos voltam a comer carne, comer chocolate, beber cerveja ou coca-cola, a fazer sexo ou a cheirar rapé, festejando o fim do período da quaresma. Eu, com muita vontade, continuo fazendo tudo isso. Afinal, não sou tão pecador assim ao ponto de me penitenciar com privações de prazer.

É chegada também a Páscoa! A festa do coelho ovíparo que representa a ressurreição do filho de uma virgem que engravidou de uma pomba branca e que é ao mesmo tempo o pai e o filho. Total nonsense, não?

Em comemoração a tudo isso e mais um pouco, abraço-lhes com este incrível vídeo, de uma teatralidade fenomenal e com atuações irrepreensíveis. Aí vai o petardo juvenil: e se SCARFACE virasse uma peça de TEATRO ESCOLAR?

* Este post foi "patrocinado" por @rafael_longo.

Bom feriado!

sexta-feira, 19 de março de 2010

FIT 2010 cancelado (ou de quando a incompetência é transferida)

FIT-BH 2008

Em decisão despótica, espúria e asquerosa, foi anunciado o cancelamento para este ano do 10° Festival Internacional de Teatro Palco & Rua de Belo Horizonte, o FIT. O anúncio, feito no dia 18 de março pela presidente da Fundação Municipal de Cultura, Thaís Pimentel, tomou de súbito a classe artística belorizontina. Mais lamentável que essa determinação são os argumentos apresentados para validar tal ação. De acordo com Pimentel, as eleições presidenciais e a Copa do Mundo estariam dificultando a criação da grade de programação pela curadoria. Atestar falta de espetáculos de qualidade é, no mínimo, classificar como incompetentes os renomados e nacionalmente premiados grupos do estado. Tal fala demonstra mais a incompetência dessa instituição em encontrar montagens interessantes do que estas não existirem.

Doravante, ponto primeiro: o FIT é um acontecimento bienal e em diversas edições anteriores foi realizado em ano de Copa do Mundo e eleições, da mesma forma que hoje, como em 2002 e 2006. Ponto segundo: O FIT estava programado para acontecer em agosto. A Copa do Mundo acontece entre junho/julho e as eleições são em outubro. Ponto terceiro: O FIT é um decreto municipal, uma lei (
n°9517) sancionada pelo então prefeito em exercício Fernando Pimentel, em 31 de janeiro de 2008. Assim, a sua simples não realização é ilegal. Ponto quarto: diversos artistas, grupos da capital estruturaram seu calendário para privilegiar sua apresentação em tal festival, um dos maiores do país e o mais importante evento artístico do estado. Ainda não obstante de outras passadas decisões não menos repugnantes – como a extinção em 2004 da Secretaria Municipal de Cultura, da suspensão do BH Cidadania, do Arena da Cultura e da mudança no orçamento da Lei Municipal de Cultura –, somos acometidos pela notícia de que o FIT será transferido para 2011.

Não somos apenas nós, artistas da capital, que perdemos direitos com a suspensão provisória do FIT. Mas também a população, que assiste um de seus principais eventos culturais nos processos de formação de público ser devastado por uma administração omissa, incompetente e politiquesta, que apenas comunicou a decisão sem ao menos conversar com os produtores locais. Ao que parece, não são os artistas desprovidos de adjetivos técnicos, qualitativos, ou a “repentina” Copa do Mundo que “calhou” de ser realizada neste ano, ou mesmo as já conhecidas obscuras eleições presidenciais que inviabilizaram o citado. Não há justificativa passível de compreensão. Como artista que possivelmente participaria do festival (concorrendo com o espetáculo
Sonho de uma Noite de São João, do projeto Pé Na Rua, do Galpão Cine Horto), sinto-me ensimesmado ao escrever sobre tal acontecimento.

O que nos falta não são artistas competentes – como se estes em apenas um ano o se tornassem, como sugere a presidente Thaís –, senão que administradores menos inábeis ao lidar com o já percebido boicote artístico promovido pelo nosso prefeito Márcio Lacerda. Tendo em vista, por exemplo, a suspensão das atividades culturais na Praça da Estação, que suscitou a criação de outro evento público e autoral na cidade, a
Praia da Estação, corroboro o pensamento de Marcello Castilho, do jornal Estado de Minas: o autoritarismo, a decisão de gabinete, a burocracia, o estorvo causado por uma política exclusiva, são apontamentos para que tais eventos sejam administrados por outros, que não órgãos públicos, maculados pelo constrangimento político, posto que a viabilização de tais festivais vem dos impostos cobrados da população. Em suma, recordo de uma tira do espetacular Quino, por sua Mafalda, na esperança de que nossa reivindicação não seja preterida como na charge:

terça-feira, 9 de março de 2010

João Página Planta cai do décimo quinto andar


João Página Planta fracassou enquanto (naquilo que queria ser) homem de verdades verdadeiras. Cômico, visto que sempre teve dificuldades em expressar as verdades de sua vida e quando o faz, cai em descrença. Fez com que suas palavras – transcrição de seus sonhos – se esvaíssem em seu primeiro momento de fraqueza; aquele momento em que tantas vezes afirmou, com veemência, conseguir transpassar sem maiores infortúnios e pormenores.

Agora, lá está ele sem saber o que fazer, envolto em sua manta de manias necessárias e com medo de tudo aquilo que imagina estar em iminência de acontecer.

Nunca foi de elaborar o futuro, pelo fato de sempre querer ‘fazer’ o presente da forma mais adequada possível. Uma organização sistemática que o guia por caminhos retos, mas sempre com destinos tortuosos. Achava que seria diferente.

Busca, agora, confortar-se em algo que o faça mais capaz, ainda que sem muito sucesso, por enquanto. Tenta conseguir engolir a bola de pêlo que lhe foi enfiada goela abaixo, procura entender aquilo que não é de compreensão, aposta que suas lágrimas estão aptas a secar, ainda que sujando a alma, para depois a chuva lavar; e, por fim, arrisca-se em manter-se pronto, decidido e composto para arrostar qualquer coisa que ponha sua veracidade em questão, como quem põe o coração numa frigideira.

Não suficiente, teve seus sentimentos colocados em xeque, como quem aponta o dedo na direção de alguma cara mentirosa. Agora é castigado por conta daquilo que sente, como se fosse possível punir alguém por gostar, amar e desejar. Carrega o fardo de um peito cheio de coisas boas, como se isso fosse realmente uma carga ruim.

Mesmo assim, desiludido que só ele, não vai deixar de ter seus sentimentos como nobres e nem de pensar que eles podem instigar qualquer superação, mesmo já tendo vivido o suficiente para saber que as coisas são mais cinzas do que se pode imaginar. Não vai ser porque uma vez foi assim que assim sempre será. Se desse jeito fosse, teria pulado do barco em outras tempestades no mar.

Para falar de suas características, não costuma insistir em sofrer. Depressão pra ele nunca existiu. Sempre teve ojeriza ao papel de bobo, idiota e panaca, apesar de encarná-lo vez ou outra. Nunca aceitou ser injustiçado. Não pratica desperdícios e nem fenece em desistências fatalmente diminuidoras. Nunca foi homem de bom prumo. Aprendeu a ceder e a compreender. Sente sua ferida arder para soprar a de outro.

Mesmo assim, cheio de tristeza e com a carcaça reduzida a restos mortais, optou por ser esperançoso, por acreditar que tudo aquilo que viveu, leu e escutou não há de ser poesia jogada ao vento. Ainda tenta entender como uma pessoa entra sem convite, estraga tudo e depois dá de costas para ir embora. Ainda insiste em confabular sobre o egoísmo humano, mas já sem muita insistência. Ainda persiste em muitas coisas nas quais não deveria. Todavia, seguirá com a sua vida atrás de tudo aquilo que deseja ter; sabe que é capaz e merecedor e leva consigo a certeza de que, com sorte, há de ter sorte algum dia.

Que coração mudado, esse de João Página Planta...

Da roda de Tango

Não entendemos ou sequer vislumbramos entender o que é o Tango para os Argentinos. Não falo da música, como me disse um portenho "triste, nada alegre, são cores cinzas". O rito de apreciação de uma interpretação de um tango beira o rompimento do espaço. Existe um respeito imensurável com tal cultura. Estar em Buenos Aires e ir a um Tango ou uma Milonga é como ir ao Rio ouvir Samba na Lapa. A diferença, entretanto, não está na entonação de quem canta ou toca, no espaço miúdo que ambos abraçam suas melodias, muito menos nas pessoas que, bonitas, se regozijam ao ver uma potente interpretação. Tal visceralidade existe em ambos.

Contudo, os
cantantes de Tango parecem sustentar uma alcunha distinta. Entra-se num bar, percebe-se o movimento, mira-se as pessoas que conversam incessantemente produzindo uma cacofonia estranha (natural à todos os ambientes lotados) e aguarda-se o acorde inicial. Até aí, em nada se distingue os dois estilos e lugares em que estes são executados. Todavia, ao soar a primeira nota, em vez de um esfuziante acordar o corpo para o ritmo, o que acontece é o contrário, um acender de olhos para o espírito. Tal definição pode parecer piegas, epifania barata, mas é algo próximo a isto. Bêbados e drogados, jovens e velhos, abstêmios comportados ou putas despudoradas, são tomados de um imenso silêncio. O cômodo pequeno, com suas paredes maturadas por tantos anos de sobe e desce bebidas, torna-se um espaço sagrado, como se o violeiro e o intérprete fossem os papas dessa missa profana, que em vez de hóstias traz lamentos, martírios bons de serem passados.

Assim como o passo clássico do Tango que não existe de fato na dança (aquele com as mãos arqueadas na altura do ombro, como flechas que cortam o ar), minha noção passageira desse estado de respeito com tal arte é algo absoluto. Não temos, contudo, mais ou menos respeito com nosso Samba, são amores distintos. Mas observar uma cultura tão fiel às suas criações embebeda e transforma, de alguma forma, todos que a apreciam. Que o diga seu maior representante Carlos Gardel que, por um equívoco do acaso, foi nascer em outra pátria.

terça-feira, 2 de março de 2010

Paralipômenos de uma obra sentimental


A insegurança é – também – diretamente proporcional à evolução do sentimento. Explica-se, assim, a carência aparentemente sem motivos, a persistência dolorosa dos pés atrás, o medo do desenvolvimento daquilo que se sente e a sensação covarde da desistência.

De início, palavras se mostram suficientes. Posteriormente, acontece que gestos e atitudes tornam-se meio que necessários; tanto para abalizar aquilo outrora dito ou apenas para demonstrar reciprocidade sem maiores pretensões. Bom seria se, doravante, todos assim enxergassem e compreendessem este imbróglio. Boa parte da fábula que envolve relacionamento homem x mulher seria dissolvida.

Concomitantemente, pior que isso são aqueles que, como eu, fingem entendimento nas coisas quando, na verdade, não passam de exemplares taciturnos, taludos e ventrudos desses quiprocós mundanos e que ficam mirabolando relações diretas ou inversas sobre aquilo que sentem ou deixam de sentir.