quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

O que é o Caradelivro senão um periódico ininterrupto e celeumático?

                          


"Que flecha é aquela no calcanhar daquilo? Picatacapau! Pela pena é persa, pela precisão do tiro — um mestre. Ora os mestres persas são sempre velhos. E mestre, persa e velho só pode ser Artaxerxes ou um irmão, ou um amigo, ou discípulo ou então simplesmente alguém que passava e atirou por despautério num momento gaudério de distração."

Paulo Leminski são muitas janelas. Assim como o Facebook. No entanto, o que se lê em ambos é algo discrepantemente distinto. É um dístilo por onde passam camelos do tamanho de girafas e formigas do tamanho de pulgas. Por isso, uma discussão ainda não inventada: subliteratura ou aliteratura. A primeira, mais direcionada ao polaco cachorro louco, tornou-o hoje um best-seller, um guru da poesia concreta-haiku-livre. A segunda, a algo que ainda não existe precedente - muito menos excedente - em nossa cultura ocidental, mas que não é nada. Não comunica, não informa, não divulga, apenas cita. E essa citação em vários momentos, é carregada de diversas páginas de escrita, fotos do tudo, em uma tentativa de citar o incitável, a incitação ao incitamento. Mas, infelizmente, até para quem o lê apenas como mais um jornal matutino (vespertino e noturno), tem menos massa substancial ali do que três versos do poeta.
Ou seja, apesar da internet ter se tornado o sonho de D´Alembert e Diderot da Enciclopédia, não há nada como a leitura de "Toda Poesia" (aqui um conselho: um bom lugar para se lê-lo é no banheiro, aliado a uma bela cagada). 

"Flecha se atira em movimento, ninguém está parado. Nem o cavalo, nem o cavaleiro; nem a mente, nem a mão; nem o arco, nem a flecha, e o alvo o vento leva: tiro certo. Dentiscalpium in oculo. Todo teu lado direito puxa a linha, todo o esquerdo segura a flecha. Spes! Tiro feito, volta-se à unidade perdida."

No entanto, ela se tornou um best seller. E gerou, evidentemente, um repúdio naqueles que já conheciam suas imagens, palavras, riscos. Fato semelhante ao que acontece quando alguém conhece uma banda essencial e logo que ela se torna "famosa" a pretere impreterivelmente: "som de merda". Agora lançam outro: Vida.
- Então quer dizer que ele ainda continua escrevendo?
- Não imbecil, ele está morto. Esse livro é de 90.
Entrou pela Porta dos Fundos e Veja, hospedou-se na Estante Virtual da nossa cabeça. Associado a isto, Instagram  posta no "seu" Zuckerberg que comprou o WhatsApp, isto tudo em meio à Vida. Nem o bigode mais espesso esconderia atrás de seus dentes podres um bafão maior que este. Suprimida pelas nuvens, a Vida agora é artigo/presente intelectual. Pode tomar nota: não tem para Paulo Coelho, o samurai Bashô ou Jesus, o catatau modal brasileiro, a Ervilha da Fantasia tupiniquim é um misto de subterrâneo e aliteral. Só que o subterrâneo explodiu. O melado magma estourou feito um orgasmo Multiplus cheio de Smiles. A poesia vence a falta dela. O distraído venceu, sozinho e inexplicavelmente. E a aliteratura, o ágrafo, continua sem entender nada - como de costume.

"Mas arcos atrás isso não é coisa que se diga, que se faça, arqueiro pouco diz. Cala-se, de hábito, porque ignora tudo na arte em que é exímio. Depois, velhos não são dados a festas."

Mas, afinal, diga-me, no que você está pensando?

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Da explicação (ou de quando o hiato incomoda até a quem o exerce)


Período de recesso.
Retorno indeterminado.
Tempo para que.

Volta dia qualquer.
Quando vir é.
Não é nada.

Todo silêncio certo dia passa.

Quiçá um dia até.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

As cores, aromas e formas

Sendo pouco e era muito
Sendo forte, embora pequeno
Sendo rico sem ter moeda

Tendo cores e não cinzas
Tendo vozes, miúdas e franzinas
Tendo barro, fogo e mãos

Feito graça em rosto circular
Feito gênio ante seu carrasco
Feito lança que busca o peito

Isto é aquilo que se foi
Isto é aquilo que o é
Isto é apenas e desmedidamente um tudo

Welcome genius!


Já é mais do que público e notório que Sir Paul McCartney já fez e ainda fará shows aqui em nossas terras tupiniquins neste mês. Já fazia um bom tempo desde a sua última estadia aqui, em 1993, e a legião de fãs saudosa já não aguentava mais esperar. Este que vos fala ainda mais. Fã confesso, ainda era muito jovem em 93 e por isso não tive a oportunidade de ir conferir o gênio ao vivo. Desta vez, já estou lá.

Garimpando velhas pastas de arquivos antigos, achei uma crítica que escrevi ainda na faculdade de Jornalismo, para a disciplina de Jornalismo Cultural, em 2005. Paul McCartney tinha acabado de lançar seu penúltimo disco "Caos and Creation in the Backyard" e eu me lembro que fiquei abismado com tanta qualidade; e já fazia um bom tempo que o Macca não lançava um belo disco.

A crítica é repleta de parcialidade, vícios acadêmicos e algumas 'cruezas' de estilo. Todavia, segue abaixo para apreciação e para tirar um pouco desta tonelada de poeira que estacionou por aqui.



O gênio e o seu quintal





Não seria audácia nenhuma dizer que Chaos and Creation in the Backyard é o melhor trabalho solo de Paul McCartney. Lançado esse ano, o disco é um marco na brilhante carreira do artista. Sucesso de crítica, o vigésimo trabalho solo de Paul, gravado em Londres e Los Angeles nos últimos dois anos, traz treze canções inéditas, todas escritas e compostas por ele.

No álbum, Paul McCartney toca a maioria dos instrumentos, assim como fez em seu primeiro trabalho solo, McCartney, de 1970. Sua banda de apoio toca apenas em uma das músicas do disco, intitulada Follow Me. Quem leva os créditos da produção é Nigel Godrich, renomado produtor inglês que já trabalhou com nomes como Radiohead e Travis, por exemplo.

Paul McCartney vinha sendo alvo constante dos críticos por fazer muitos discos lentos, românticos, melosos; que acabavam por ficar sem brilho. Chaos and Creation in the Backyard é a superação no que diz respeito a essa questão. Não que o disco seja mais rápido, socado ou hard; pelo contrário. É lento, romântico, recheado de baladas, mas é leve, bonito e inovador.

Uma combinação de lindas letras que falam de amor, amizade, paixão e desejo, arranjos perfeitos, linhas harmoniosas sem erros, orquestração de primeira categoria e uma parte instrumental impecável; com direito a flauta block, harmônio e flügelhorn, instrumentos novos trazidos por Paul. Com alto nível de qualidade poética, traz uma mistura de clássicos empolgantes de piano de McCartney e faixas mais introspectivas. A impressão que dá é que cada nota tirada dos instrumentos é uma resposta às palavras cantadas. A voz de McCartney, apesar de ele ter passado dos sessenta anos de idade e de ter fumado inúmeros cigarros em uma vida que conheceu os excessos da década de 1960, continua incrivelmente suave, macia, forte e ainda contando com os famosos falsetes que, com maestria, não desafinam.

O que faz Chaos and Creation in the Backyard ser o melhor disco de Sir Paul e um sucesso de crítica é o fato de lembrar, e muito, uma época de ouro de sua vida. O álbum remete à fase final dos Beatles e ao começo de sua carreira solo, em 1970. Mas McCartney ainda faz um resgate de outras épocas da extinta banda, e isso é facilmente perceptível. Ao escutar o disco nota-se facilmente que algumas músicas são parecidíssimas com as dos Beatles. Por exemplo, English Tea parece ter saído do White Album e Fine Line tem a mesma levada soberba de Lady Madonna. O próprio Paul McCartney descreve Jenny Wren como sendo “a filha de Blackbird”, um dos maiores clássicos dos Beatles. Ele também resgatou algumas coisas da sua fase com o Wings, banda pós-Beatles, que contava com a participação de sua falecida mulher Linda McCartney nos pianos e backing vocals e de um de seus filhos nas guitarras. Um exemplo é a música A Certain Softness, que segue a linhagem de Bluebird, do disco Band on the Run, do Wings.

De fato, todo esse processo solitário de composição ao qual Paul McCartney se submeteu valeu a pena. Paul conseguiu sair de sua pior fase, que eclodiu em 1993 com o fraquíssimo Off The Ground. Por vezes, Paul fez jus a sua história com trabalhos de alta qualidade. Porém, em outras ocasiões, mais especificamente nos últimos anos, o peso da “herança Beatles” pode ter sido demais para ele.

De acordo com o próprio artista, o êxito se deu graças a uma única fórmula: respeitar o passado e, ao mesmo tempo, livrar-se dele. Além, é claro, da contribuição do produtor Nigel Godrich.

O disco se alterna em dois momentos: o de introspecção e o de liberdade. A introspecção surge quando se nota o predomínio do trabalho de Godrich, marcado sempre por um clima carregado, com sons e arranjos não convencionais, como frisou a revista Rolling Stone. Já a liberdade aparece quando a mão de Paul se mostra mais presente, com melodias e arranjos inspirados.

Enfim, ouvir Paul McCartney cantando como se ainda fosse um beatle talvez seja a melhor coisa que Chaos and Creation in the Backyard nos proporciona.


Ficha Técnica

Ano: 2005

Gênero: Clássicos do Rock

Procedência: Nacional

EMI; ASIN: 094633795921


Faixas

1. Fine Line
2.
How Kind of You
3. Jenny Wren
4. At the Mercy
5. Friends to Go
6. English Tea
7. Too Much Rain
8. A Certain Softness
9. Riding to Vanity Fair
10. Follow Me
11. Promise to You Girl
12. This Never Happened Before
13.
Anyway

domingo, 17 de outubro de 2010

A ponte dos dois arcos

Interessante notar que não são pessoas extremistas, partidárias, que dizem algo, na maioria das vezes, sobre o político. Se o dizem, são os próprios que se contradizem ou delatam uns aos outros.

Notar, nas palavras de Leonardo Boff, que o governo neoliberal passado teve seus louros, como a estabilização da economia, não pode ser algo descartado. Contudo, a custa de que ou de quem é a causa maior deste sentimento vil, repugnante, mas talvez não menos demasiado quanto à aversão aos pobres.

Não é possível uma política econômica social baseada em tais ditames. Em certos momentos, quando não há horizonte a ser descoberto, havemos de ter parcimônia e desconfiança com certas propostas ilusórias e maquiavélicas.

Nosso país cresceu, distribuiu renda, fortaleceu sua economia e possibilitou, se não um novo horizonte, ao menos um mais calmo, repleto de sobreviventes de uma nau passada que naufragou com suas propostas negligenciadoras e sectarizantes.


terça-feira, 5 de outubro de 2010

Stand Up Comedy Eleições 2010

Foi-se o primeiro turno das eleições deste ano e os resultados, como sempre, são dignos de falta de comentários. Para a segunda etapa, restou a nós mineiros apenas a disputa pelo altar-mor, o trono maioral. Um incômodo tremendo. Gostaria que tudo tivesse fim no domingo passado. Pior que isso só a permanente cara de confiante dos vermelhos, mesmo com o susto, e a agora mais corada cara dos azuis, que já mendigam o apoio dos verdes. Uma gororoba resultante de uma mistureba feita por oposição e situação, se é que isso ainda existe e se é que posso dizer dessa maneira. Todo mundo sorrindo, mostrando os dentes, mas todos com cara de palhaço. Menos o próprio palhaço, que agora tirou a máscara e vai posar de terno, gravata e colarinho branco. Além das orelhas e do rabo de burro. E nós aqui, na mesma, fingindo satisfação...

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

A condição constitucional

A possibilidade do não voto. E isto não é, acredito, nenhuma precaução exacerbada, uma covardia ou um abrir mão de um direito constitucional. Esse pormenor, inclusive, é discurso fácil nos lábios ditos democráticos, progressistas, que verbalizam um direito ao voto como algo contemporâneo, recente, mas que na verdade é retrógrado, arcaico em seu pensamento. Afinal, se o voto é livre e democrático, porque então obrigar o eleitor a fazê-lo? Sob pena de pagar multa (mesmo que irrisórios R$3,50), não conseguir emitir seu passaporte (tendo que ir a um cartório regularizar sua situação), além de ser proibido pela Justiça Eleitoral de participar de concorrência pública ou administrativa da União, dos Estados, dos territórios, do Distrito Federal, dos municípios ou das respectivas autarquias e não poder pedir empréstimo por meio de qualquer estabelecimento de crédito mantido pelo governo, é mesmo algo democrático?

Evidentemente que todas estas situações são extremamente fáceis de serem resolvidas. Mas apenas o constrangimento que pode ser causado por elas já é característica execrável de qualquer processo democrático. Se uma democracia é o regime em que o poder de tomar importantes decisões políticas está com os cidadãos, direta ou indiretamente, estes também deveriam ter o direito de não votar, posto que isto já seria uma manifestação política. E digo não votar como o não comparecimento à zona eleitoral sem nenhuma punição futura.

Parece-me que a Constituição democrática, conseguida pelas Diretas Já!, apenas reforça o apontamento de que somos induzidos a seguir com as situações vigentes, tendo nossos direitos de protestar, requerer e cobrar satisfações sendo transmitidos à orgãos particulares, como a televisão, o rádio, os jornais, em suma a mídia que transborda nossas cabeças com informações desconexas e muitas vezes omissas diante de interesses escusos de formatação da notícia. E nós, claro, patentiados e registrados por uma credibilidade burra que confiamos a estes mecanismos, apenas nos resignamos ao pensamento recluso, em mesas de bar, que apenas resultam, muitas vezes, em uma dolorosa ressaca (moral e alcoólica).

Não entendo como a obrigação em votar deve ser tomada como algo "bom" por nossos antecessores que, apesar de corretos e históricos, deixaram para nós o pequeno detalhe da intolerância eleitoral. Acompanhando os debates, principalmente pela televisão que, apesar de tudo, é o único lugar em que se vê e ouve o candidato no instante em que este se pronuncia, sem maquiagens, montagens ou arremedos de marketing dilmísticos, percebo que a triste notícia é: não há em quem votar.

E este discurso inclusivo de atinar para "exercer o meu direito" é tão ou mais piegas do que dizer que o Tiririca é analfabeto - engodo desesperado dos literatos sem voto - ou que o Serra é parente próximo do Mr. Burns. Se o comediante (o Tiririca) o é ou o fosse, isto não lhe retiraria o direito de se candidatar. Se ganhar e não souber assinar seu próprio nome na ata de posse, daí é outra história.

E para os pessimistas, os otimistas, os revolucionários, os militantes fervorosos que ainda acreditam em ideologias partidárias, oriento que não vai haver nenhuma mudança drástica em nossa economia, nossa legislação ou Constituição - mesmo com a vitória do octogenário líder da juventude Plínio de Arruda Sampaio. O que veremos serão atitudes austeras que apenas nos arrastarão por mais quatro anos até a eleição presidencial de 2014, a ser vencida, bem provavelmente, por Luís Inácio.

Assim, votarei nulo. Sem remorso, pensamento anti-cidadania ou complacência ideológica com estes idiotas que picham "vote nulo" e nem sabem os nomes dos candidatos. Atestar que isto é alienação é tão estúpido quanto os próprios eleitores que votam por obrigação. Isto representa apenas uma escolha legal, de um cidadão que não percebe perspectivas nas propostas apresentadas. E a este direito, reservo-me como atuante e efusivo representante do processo eleitoral brasileiro.

obs: para os demais cargos, ainda estou a especular.